António José Saraiva |
Participo com gosto nesta valorização colectiva do E.Lourenço. Porque, em primeiro lugar, sou um grande admirador dos seus escritos e isto há muitos anos. Por outro lado, quando se fizer a história da crítica literária em Portugal, nesta época, Eduardo Lourenço há-de ser lembrado como um dos mais notáveis críticos literários pela sua penetração, pelo seu saber e pela sua intuição.
(...) Vasculhando na memória, lembro-me de ter tido uma única polémica com o E.L. a respeito do que se chamou descolonização. Na altura, não contestei a descolonização que talvez fosse inevitável e, talvez, estivesse na lógica da História – mas recebi no peito um golpe que ainda não cicatrizou de assisitir ao epsectáculo da debandada indescritível inexplicável e injustificável das Forças Armadas de África e de outros lugares, e essa ferida contribuiu fortemente para o estado de pessimismo político em que ainda me encontro e que, na altura, me levou a escrever um artigo que causou um certo escândalo: “O 25 de Abril e a História”.
Não sei se foram os militares se as autoridades governamentais que procuraram atenuar o efeito daquele artigo propondo um debate sobre ele. Fiquei contente por ser o Eduardo Lourenço o escolhido porque estava na presença de um crítico inteligente. De facto, pensando agora – a estes anos de distância – nas suas críticas acho que ele não rebateu o essencial do meu texto nem o quis fazeer. O que o impressionou, julgo, foram as circunstâncias em que o artigo foi produzido. A verdade é que sou impaciente e hiper-sensível a certas críticas, que dificilmente suporto a crítica estúpida, mas saí satisfeito desse debate.
*António José Saraiva (Leiria, 1917- Lisboa, 1993). Professor e Ensaísta.
O texto que aqui se reproduz é um excerto de um depoimento publicado no Jornal de Letras, Artes e Ideias, Lisboa, 6/XII/1986, p. 14.