quarta-feira, 24 de julho de 2013

Remodelações governamentais na Cultura?


Eduardo Lourenço e Luís Machado no Martinho da Arcada (30/IX/2009)
 Em tempo de mudanças governamentais, seja lá o que tal conceito possa significar (atendendo ao que os últimos acontecimentos políticos têm feito para o enriquecimento semântico irrevogável? da língua portuguesa, nada hoje parece seguro), interessa recuperar uma quase nomeação de Eduardo Lourenço para a pasta governamental da Cultura. Ou melhor, duas. É o próprio quem se refere a esses dois episódios durante uma curiosa conversa mantida com Luís Machado no café lisboeta Martinho da Arcada, realizada em 30 de Setembro de 2009, transposta para capítulo de livro no ano seguinte. À pergunta  de Luís Machado sobre se teria mesmo sido convidado para ministro da Cultura, responde o ensaísta nos seguintes termos:

Artur Portela Filho, director do...
 


«Fui, duas vezes. Uma vez, “virtualmente”, nomearam-me ministro sem me dizer nada, veio num jornal. Nessa época, como sabem, saía um jornal dirigido pelo meu amigo Artur Portela que se chamava Jornal Novo. Nesse jornal foi publicada uma lista do novo Governo, que era tutelada pelo famoso Grupo dos Nove. Vinha então nessa lista: “Ministro da Cultura fulano”. Naquela altura estava eu em férias, e a minha mulher chegou com um telegrama na mão e disse-me assim: “Mon cher, te voilà ministre”. Eu, atónito, indaguei: “Mas que é isso?” Ela respondeu: “Parece que és ministro.” Mas com o ar mais francês possível. Do que se tratava? De gente do teatro, do cinema, que me mandava um telegrama a felicitar-me por eu ter sido nomeado ministro. Tudo aquilo só existiu num jornal, não teve nenhuma espécie de resultado. Quando fui convidado, foi mais tarde, pelo major Vítor Alves. Os meus problemas eram os mesmos de sempre. Eu não seria nunca a pessoa certa para o local certo. Não podia aceitar uma coisa dessas. Não fui feito para mandar em ninguém. Talvez porque não gosto que mandem em mim. Veleidades de fazer qualquer coisa pela cultura portuguesa, noutro sentido, sim, mas não ter esse tipo de responsabilidades. Não tenho nenhuma apetência de ordem política» (Luís MACHADO, Rostos da Portugalidade com Mário Soares, Júlio Pomar, Eduardo Lourenço, Manoel de Oliveira, Carlos do Carmo, Ruy de Carvalho, Lisboa, Vega, 2010, pp. 104-105).
Major Vitor Alves

Com a descontracção de quem se prepara para ir a banhos (com a firme promessa de regressar em Setembro), Ler Eduardo Lourenço confessa que  lhe agrada muito a nenhuma apetência do autor de O Labirinto da Saudade para funções governativas. Quase tanto como lhe desagrada a apetência em excesso por pastas governativas, manifestada alguns dos políticos da nossa praça. Boas Férias!