quinta-feira, 14 de abril de 2011

Edmundo Lucena: acerca de um lapso indesculpável




Ler Eduardo Lourenço não sabe ao certo se foi por lamentável ignorância ou por não menos absurdo esquecimento, mas a verdade é que, no texto de Janeiro passado com o título “Quem é Edmundo Lucena?”, induziu os seus visitantes em erro, quando disse que «nunca até hoje ninguém revelou a identidade deste “assistente de filosofia, a respirar inteligência e inquietação”» a que Miguel Torga, em A Criação do Mundo, chamou Edmundo Lucena.
Carlos Mendes de Sousa

Ora, isso é falso! De facto, num belíssimo artigo publicado na revista Relâmpago com o título “Eduardo Lourenço: a cidade, o poema”, Carlos Mendes de Sousa esclarece que em «A Criação do Mundo, é-nos dado a conhecer como o consultório médico do narrador-protagonista, nas horas de desafogo, se transformava num “centro de cavaqueira e conspiração”. Há um parágrafo onde são referidas algumas personagens desse círculo, em relação às quais é fácil de descodificar os nomes verdadeiros, concretamente duas personagens que já tinham tido um papel digno de registo na diegese, Gonçalo e André (Martins de Carvalho e Paulo Quintela) e que constituíam o núcleo forte do grupo. O narrador faz ainda referência a alguns jovens, sem direito a nome, que também frequentavam as tertúlias. Contudo, neste contexto, há um jovem que é nomeado. Desde logo o identificamos a partir das iniciais: “Edmundo Lucena, assistente de filosofia, a respirar inteligência e inquietação”» (Carlos Mendes de Sousa, “Eduardo Lourenço: a cidade, o poema”, Relâmpago. Revista de Poesia, nº 22, Lisboa, Abril de 2008, p. 104).

Miguel Torga

Feita a rectificação devida, Ler Eduardo Lourenço arrisca uma outra pista para decifrar as razões da escolha do nome Edmundo. Não será ela também uma discreta homenagem (ou até uma subtil brincadeira...) ao fundador da fenomenologia, Edmund Husserl, e que o jovem “assistente de filosofia” descobria com entusiasmo por essa época nas bibliotecas da sua Faculdade? Tratando-se de um autor como Torga será isto com certeza pouco provável, mas não deixaria de fazer algum sentido.

Edmund Husserl