O espaço da comunidade
dos povos de língua oficial portuguesa define-se mais em termos de cultura do que
em termos de soberania ou soberanismo mesmo virtual. Constituem-no nações
politicamente independentes, situadas em três continentes, com laços históricos
seculares com a pequena nação europeia que chamamos Portugal. Apesar desses laços,
de leitura diversa segundo os casos, o único que pode legitimar a utopia
histórico-geográfica que designamos por CPLP é a partilha, também ela complexa
e diversificada, do português como língua oficial dos países dessa comunidade,
assumida como tal, e enquanto o for. Fora dessa partilha o conceito, algo
voluntarista, da CPLP, não teria ou não pode ter sentido algum, nem histórico
nem cultural.
Parece que uma nação
africana próxima da nossa antiga colónia da Guiné-Bissau manifestou o seu
interesse em participar também nessa comunidade de inscrição cultural lusófona.
Se a CPLP fosse uma mera associação de nações com interesses económicos mais ou
menos convergentes, o desejo da Guiné Equatorial de querer participar nela
seria apenas uma questão de ordem política empírica a ser resolvida entre os
membros da CPLP e a nova postulante. Não é o caso. O estatuto da CPLP é apenas
o da ordem cultural, quer dizer, o vínculo linguístico. Pela natureza das
coisas a Guiné Equatorial por enquanto está fora do critério que justifica e
onde se inscreve a sigla CPLP. Questão não posta está resolvida por si. De
outro modo a CPLP seria apenas a versão africana do tonel das Danaides:
preciosa água escorrendo em vão para lado nenhum.
* Texto de Eduardo Lourenço que apareceu há exactamente quatro anos na imprensa (“A CPLP não é o tonel das Danaides”, Público, 23/VII/2010, p. 2) e que aqui se reproduz, sem quaisquer outros comentários, no dia em que a Guiné Equatorial se torna oficialmente membro da CPLP.