Margarida Calafate Ribeiro (imagem recolhida em http://angnovus.wordpress.com) |
Margarida Calafate Ribeiro e
Roberto Vecchi acabam de organizar mais um volume da colecção que a
editora Gradiva tem dedicado, desde 1998, às obras de Eduardo Lourenço,
publicando (ou recuperando edições há muito esgotadas), à media de um
volume por ano, diversos títulos do ensaísta. O nome do livro agora dado
à estampa, Do Colonialismo como Nosso Impensado, poderia
indiciar uma novidade absoluta. Em rigor, não se trata bem disso, pois o
leitor dispõe agora, isso sim, de uma reunião de ensaios (uns
dispersos e outros completamente inéditos, recolhidos no Acervo de
Eduardo Lourenço) que se juntam em torno do opúsculo Situação Africana e Consciência Nacional (1976), que, desde há muito se, encontrava indisponível no mercado.
Essa
é, de facto, a primeira boa notícia pois, como assinala Eduardo
Lourenço no belo texto introdutório, «os quarenta anos de atraso com que
estas páginas são publicadas, ou reeditadas, não são, paradoxalmente,
um anacronismo, como poderiam aparentar» (p. 11). Com efeito, a reflexão
que o autor de O Fascismo Nunca Existiu dedicou à colonização, à descolonização e ao que hoje se chama mundo lusófono são,
não apenas peças essenciais da sua obra, como algumas das páginas mais
lúcidas que, em língua portuguesa, se escreveram sobre cada um dos três
temas e, talvez mais importante, sobre o modo eles se articulam entre
si.
Roberto Vecchi (foto Ler Eduardo Lourenço) |
Em breve e rigorosa nota editorial que integra este volume, Margarida
Calafate Ribeiro e Roberto Vecchi explicam os critérios usados na
escolha dos textos aqui incluídos e, ao mesmo tempo, propõem uma
hipótese hermenêutica que confere, sem dúvida, uma maior legibilidade
global a Do Colonialismo como Nosso Impensado que, por outro lado, muito ganha em ser relacionado com vários capítulos de A Nau de Ícaro seguido de Imagem e Miragem da Lusofonia (Lisboa, Gradiva, 1999 e São Paulo, Companhia das Letras, 2001).
Ler Eduardo Lourenço nada tem a apontar quanto à metodologia seguida, nem quanto aos seus pressupostos que, de resto, aparecem muito bem explicitados. A qualidade dos dois investigadores, a quem se deve, por exemplo, o notável trabalho realizado no âmbito da Cátedra Eduardo Lourenço na Universidade de Bolonha, tem aqui nova e eloquente demonstração. Ainda assim, e numa primeira leitura de Do Colonialismo como Nosso Impensado, um pormenor não deixa de saltar à vista. É que parece complicado compreender que alguns dos textos que constam deste livro tenham sido já publicados em outros volumes da colecção Gradiva, prática (desnecessária, sobretudo se atendermos ao volume e à riqueza consideráveis da produção ensaística de Eduardo Lourenço) que, de resto, sucedera também em volumes anteriores. No livro de 2014, esse é o caso, entre outros, de “A Africanização”, ensaio publicado no Expresso, em Agosto de 1975 e reimpresso depois no livro Os Militares e o Poder (1975). Ora, Os Militares e o Poder conheceu uma segunda edição na Gradiva em ... 2013! Ou seja, quem tiver comprado os dois últimos volumes desta colecção depara-se, por duas vezes, com “A Africanização”, o que talvez pudesse ter sido evitado. Dir-se-á que “A Africanização” se enquadra perfeitamente neste volume e isso é verdade, como, de resto, o seria talvez para outros textos tematicamente afins que aqui não aparecem e que também se adequariam.
Mas o essencial é que, com Do Colonialismo como Nosso Impensado, poderão os leitores e admiradores de Eduardo Lourenço regozijar-se com a divulgação em estreia de vários belíssimos ensaios sobre a (des)colonização, de que se destacam talvez “Ideologia multirracialista ou defesa do Apartheid?” (curto texto que vai muito mais longe do que uma certeira denúncia das incongruências diplomáticas do Estado Novo, pp. 36-39) ou “As contradições da mitologia colonialista portuguesa” (pp. 53-91), e com a recuperação integral do magnífico Situação Africana e Consciência Nacional, uma reflexão poucas vezes citada* e cuja leitura (ou re-leitura) se recomenda vivamente.
Ler Eduardo Lourenço nada tem a apontar quanto à metodologia seguida, nem quanto aos seus pressupostos que, de resto, aparecem muito bem explicitados. A qualidade dos dois investigadores, a quem se deve, por exemplo, o notável trabalho realizado no âmbito da Cátedra Eduardo Lourenço na Universidade de Bolonha, tem aqui nova e eloquente demonstração. Ainda assim, e numa primeira leitura de Do Colonialismo como Nosso Impensado, um pormenor não deixa de saltar à vista. É que parece complicado compreender que alguns dos textos que constam deste livro tenham sido já publicados em outros volumes da colecção Gradiva, prática (desnecessária, sobretudo se atendermos ao volume e à riqueza consideráveis da produção ensaística de Eduardo Lourenço) que, de resto, sucedera também em volumes anteriores. No livro de 2014, esse é o caso, entre outros, de “A Africanização”, ensaio publicado no Expresso, em Agosto de 1975 e reimpresso depois no livro Os Militares e o Poder (1975). Ora, Os Militares e o Poder conheceu uma segunda edição na Gradiva em ... 2013! Ou seja, quem tiver comprado os dois últimos volumes desta colecção depara-se, por duas vezes, com “A Africanização”, o que talvez pudesse ter sido evitado. Dir-se-á que “A Africanização” se enquadra perfeitamente neste volume e isso é verdade, como, de resto, o seria talvez para outros textos tematicamente afins que aqui não aparecem e que também se adequariam.
Mas o essencial é que, com Do Colonialismo como Nosso Impensado, poderão os leitores e admiradores de Eduardo Lourenço regozijar-se com a divulgação em estreia de vários belíssimos ensaios sobre a (des)colonização, de que se destacam talvez “Ideologia multirracialista ou defesa do Apartheid?” (curto texto que vai muito mais longe do que uma certeira denúncia das incongruências diplomáticas do Estado Novo, pp. 36-39) ou “As contradições da mitologia colonialista portuguesa” (pp. 53-91), e com a recuperação integral do magnífico Situação Africana e Consciência Nacional, uma reflexão poucas vezes citada* e cuja leitura (ou re-leitura) se recomenda vivamente.
foto Ler Eduardo Lourenço |
*Sobre esta dimensão menos conhecida do ensaísmo de Eduardo Lourenço, cf. também os seguintes estudos:
Miguel Real, “Eduardo Lourenço e o conceito de colonialismo orgânico”, Colóquio-Letras, nº 170, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Janeiro de 2009, pp. 273-277.
Miguel Real, “Eduardo Lourenço e o conceito de colonialismo orgânico”, Colóquio-Letras, nº 170, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Janeiro de 2009, pp. 273-277.
Maria Manuel Baptista, “Identité, Imaginaire et Mythe dans l’Oeuvre d’Eduardo Lourenço”, AAVV (Org. de Maria Graciete Besse), Eduardo Lourenço et la Passion de l’humain
, Paris, Convivium Lusophone, 2013, pp. 197-211.
João Tiago Lima, Falar Sempre de Outra Coisa. Ensaios sobre Eduardo Lourenço, Lisboa, Âncora Editora, 2013, pp. 111-130.