por Ana Cristina Dias*
Foi um pedaço de tarde particularmente sereno e de
partilha privilegiada. O director da revista Ler, João Pombeiro, evocou como marcantes da vida da
revista, dois momentos em que nessa publicação se fizeram revelações sobre a
obra de Lourenço: aquele em que trouxe luz sobre os seus heterónimos e
o outro, bem recente, em que deu a conhecer (com base no trabalho de João Nuno
Alçada) o livro de viagens em que o professor se prestou a
ghost-writer...
O professor começou evocando a "descoberta" do
mundo do livro com a exploração da mala de livros que seu pai deixou em S.Pedro,
que lhe deu a conhecer Camilo, Júlio Dinis, Júlio Verne...a partir daí
tornando-se leitor compulsivo, ao ponto de dizer não saber se foi alguma coisa
mais na vida do que um leitor.
Apontou cada livro como uma tentativa
de o autor se explicar a si próprio e discernir o que somos, de onde vimos e
para onde vamos. O livro como esforço de discernimento mas também como barca de
salvação - evocou Sherazade que, ao contar, suspendia a morte. Disse que a
humanidade não tem feito outra coisa senão contar para suspender a
morte...
Nas perguntas finais, não resisti a pedir-lhe que voltasse à mala de
S.Pedro, que continha também livros de História e que partilhasse connosco essa
impressão juvenil da leitura da História como ficção (a suprema ficção da
humanidade, como a classificou muito mais tarde).
Com imensa graça,
perguntou-me como sabia que a mala continha livros de História, que não se
lembrava de alguma vez o ter dito. Lembrei-lhe que o disse numa entrevista
antiga e ele explicou então que era verdade, que a sua grande
paixão pela História vinha desses tempos. Porém, vincou: a História ao jeito de
Michelet e não a de pendor positivista...o que daria para uma outra, muito maior
conferência, mas esta ficou mesmo por aqui.
* Ana Cristina Dias é uma visitante muito atenta de Ler Eduardo Lourenço que agora se estreia como colaboradora no blog através de um breve relato, extremamente curioso, da palestra proferida por Eduardo Lourenço e que inaugurou o ciclo de conferências Ler em Voz Alta, promovido pela revista Ler por ocasião dos seus vinte cinco anos de vida. A sessão realizou-se no Centro Cultural de Belém, ao fim da tarde, no passado dia 20. Ler Eduardo Lourenço agradece a colaboração Ana Cristina Dias e, ao mesmo tempo, renova o convite a todos os outros visitantes para também participarem no blog.
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