quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

O vento ou o mestre da vida secreta

foto de Duarte Belo in http://ruadaspretas.blogspot.pt
Todos os leitores de Eduardo Lourenço não podem deixar de saudar a publicação do seu mais recente livro: Do Brasil - Fascínio e Miragem (Gradiva, 2015). A obra, organizada e excelentemente prefaciada por Maria de Lourdes Soares, que reúne parte importante dos textos que Eduardo Lourenço escreveu no e sobre o Brasil merece, por isso, leitura atenta e pormenorizada.  
Ler Eduardo Lourenço pede licença para hoje destacar apenas um texto que considera ser absolutamente luminoso. Trata-se daquele que abre o capítulo “A Casa Perdida (páginas diarísticas)”. O curto ensaio (mas será mesmo de um ensaio que se trata?) em causa foi escrito na Bahia a 10 de Setembro de 1958 e essa parece ser sem dúvida a razão principal porque aparece neste volume. No entanto, não é exactamente brasileiro o assunto focado. É mais uma espécie de regresso sem fim que Eduardo Lourenço faz a um imemorial tempo da sua Beira Alta natal. Ora, essas pouco mais de duas páginas que o ensaísta dedica ao vento, «o primeiro companheiro da (...) [sua] infância solitária e triste», talvez mereçam entrar directamente numa antologia dos melhores momentos de sempre do autor. Não são raras as vezes em que, na prosa de Eduardo Louenço, se combinam  harmoniosamente poder alegórico e profundidade especulativa. Essa será, de resto, uma das mais importantes marcas da singularidade do seu ensaísmo. Mas o tom deste inédito, escondido durante mais de meio século, tem  uma frescura e uma beleza que, ainda hoje, surpreendem até aqueles que imaginam conhecer bem a vastíssima obra do ensaísta.