terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Escritor de um Poema Só

Acerca de Eduardo Lourenço e dos Poetas, Carlos Mendes de Sousa fala de uma «projecção desejante», talvez traduzida numa «tensão – entre o recuo e a paixão – que pensa (vive) a poesia dos outros» (“Eduardo Lourenço: a cidade, o poema”, Relâmpago, nº 22, 2008, p. 93). Daí a recorrente confissão, onde o humor não oculta ainda assim uma verdade mais profunda, do ensaísta sobre o seu sonho de ser poeta. No entanto, é bom lembrar que um dos primeiros textos publicados por Eduardo Lourenço foi, precisamente, um poema. De facto, no número terceiro da revista Vértice, publicado em Fevereiro de 1944 (tinha o Autor vinte e um anos!), o leitor encontra na página 9 um breve poema com o título “Aceitação”. Não será com certeza por causa destas quase adolescentes dez linhas que Eduardo Lourenço inscreve o seu nome entre as páginas mais importantes da cultura portuguesa contemporânea. No entanto, “Aceitação”, tal como outros textos do período a que Eduardo Lourenço chama “Tempo da Vértice”, constitui decerto um dos múltiplos motivos de interesse de Sentido e a Forma da Poesia Neo-Realista e outros ensaios, o segundo volume das Obras Completas que, dentro de semanas chegará às livrarias. Nesse volume, que conta com um texto introdutório de António Pedro Pita com o título “Inventar o Sentido do Tempo – Eduardo Lourenço e o «neo-realismo» como problema”, poderá o leitor regressar a uma cidade e tempo mágicos, a Coimbra dos anos Quarenta, e (re-)descobrir as origens daquele que é também um Escritor de um Poema Só.

“O que eu queria mesmo era voar”, entrevista por José Carlos de Vasconcelos, Visão, Lisboa, 22/V/2003, p.151.

Foto de Ler Eduardo Lourenço